As incorporadoras imobiliárias têm comemorado o resultado de um recente julgamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que afastou a tributação da permuta de imóveis. A decisão é relevante para o mercado, pois se trata de uma prática comum. É o caso, por exemplo, da troca do terreno onde o prédio será construído por futuras unidades do empreendimento.
Apesar de ser uma decisão de turma, advogados da área afirmam que o julgamento servirá de fundamento para incorporadoras, do lucro presumido, questionarem no Judiciário a cobrança, assim como pedir a devolução do que já pagaram nos últimos cinco anos.
Para Guilherme Gregori, diretor da Incorporadora Paes & Gregori, a decisão oferece mais segurança. Segundo ele, o entendimento é um alento ao mercado que usou com frequência a permuta nos últimos anos de crise econômica. “A permuta foi a forma mais comum de atuar nos últimos cinco anos. Em tempos de crise, as incorporadoras não tiveram caixa para fazer seus empreendimentos imobiliários”, acrescenta o advogado da área imobiliária, Luís Rodrigo Almeida, sócio do Viseu Advogados.
Hoje, quando realiza uma transação dessa natureza, a Receita cobra da empresa quatro tributos (Imposto de Renda, CSLL, PIS e Cofins) que correspondem juntos a um percentual efetivo de 6,73%. Já companhias que estão no lucro real não recolhem esses tributos. A Instrução Normativa nº 107, de 1988, as libera da obrigação.
No processo analisado pelo STJ, a Frechal Construções e Incorporações pede a restituição do que pagou de tributos nas permutas de três empreendimentos imobiliários. Os ministros da 2ª Turma entenderam no processo (Resp 1.733.560/SC) que não houve a comprovação de lucro da empresa com a operação, que não poderia ser equiparada à compra e venda.
A posição da Receita Federal sobre o tema foi reafirmada na Solução de Consulta Cosit nº 339, publicada neste mês. Para o órgão, “o valor do imóvel recebido em permuta compõe sua receita bruta e é tributado no período de apuração do recebimento deste”. O Fisco entende que o artigo 535 do Código Civil equipara a troca de imóveis à operação de compra e venda.
A União recorreu ao STJ após perder a disputa no Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região (sul do país). A Corte estabeleceu que a operação de permuta envolvendo unidades imobiliárias não representa aumento de faturamento, renda ou lucro. Tratando-se de mera substituição de ativos. O relator no STJ, ministro Herman Benjamin, ressaltou que o TRF da 4ª região interpretou corretamente o artigo 533 do Código Civil, “porquanto o contrato de troca ou permuta não deverá ser equiparado na esfera tributária ao contrato de compra e venda, pois não haverá, na maioria das vezes, auferimento de receita, faturamento ou lucro na troca”.
A advogada da Frechal Construções e Empreendimentos no processo, Kátia Waterkemper Machado, do Hess & Arend Advogados, afirma que o bem permutado não representa um acréscimo patrimonial para a empresa e não poderia ser tributado. “Se fosse tributada, a empresa seria tributada duas vezes: uma na permuta e depois na venda das unidades construídas”, diz.
Segundo ela, outras companhias têm conseguido anular as autuações. Em outro processo assessorado por Kátia, por exemplo, uma empresa de engenharia obteve decisão favorável também no STJ. (Resp 1481777).
De acordo com Matheus Bueno de Oliveira, sócio tributário do PVG Advogados, a Receita Federal trata a permuta como faturamento das empresas, mesmo quando não há a chamada torna (pagamento em dinheiro, além da troca por unidades). Além das operações imobiliárias, o advogado acredita que a decisão poderá ser um precedente para outros setores que usam a permuta em seus negócios. “Acho difícil a procuradoria levar o tema ao Supremo”, diz.
De acordo com o advogado Luís Rodrigo Almeida, para viabilizar as operações de permuta é assinado um contrato de compra e venda e, no mesmo ato, a escritura de confissão de dívida e promessa de dação em pagamento. Depois disso, os impostos são cobrados. Segundo ele, as duas certidões caracterizam a permuta.
“Como as empresas são obrigadas a estar com todas as certidões em dia para lançar o empreendimento, entre elas a Certidão Negativa de Débitos (CND), na dúvida fazem o pagamento”, diz.
Em um decisão recente e também favorável ao contribuinte (Resp 1.710.891/SC), o ministro Sérgio Kukina decidiu de forma monocrática não conhecer o recurso da Fazenda Nacional contra decisão do TRF da 4 ª Região. O caso envolve a Lowes do Brasil. O ministro entendeu que o STJ estaria impedido de analisar o mérito por questões processuais. Os advogados da Lowes do Brasil não foram localizados.
Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou por nota que, ao seu ver, o processo, “não traduz um precedente – uma tese geral e abstrata – extensível a outros contextos. Não somente porque o ministro Herman Benjamin indicou em seu voto-condutor circunstâncias ressaltadas pelo juízo de Blumenau e pelos desembargadores do TRF-4, como também porque não é possível afirmar que nenhuma permuta gere ganho de capital”.
A Procuradoria ainda ressaltou que a maior parte das empresas opta pelo regime de tributação com base no lucro presumido. “De modo que o lucro, sendo presumido, não depende de existir ou não resultado positivo (diferença de valor) entre os bens permutados”. Para a procuradoria, “ao fazer essa opção, a pessoa jurídica assume que os tributos por ela devidos não serão diretamente relacionados ao seu lucro ou à sua disponibilidade financeira, mas sim à receita bruta auferida por suas atividades, inclusive aquelas em que o pagamento é feito em outros bens, não em dinheiro, como ocorre nas permutas”.
Fonte: Valor Econômico